Quando seus pais
compraram a casa que um dia pertencera à família de Wendy, a
mudança do campo para a cidade pareceu menos pesada para Alice.
Apesar de não ser mais criança, ainda era excitante poder deitar na
cama de Wendy e dormir de vez em quando com a janela aberta, às
espera de Peter Pan. "Isso nunca aconteceria", pensou.
Mas um dia quando Alice
iniciou seu caminho de volta das aulas sozinha, alguém lhe passou a
mão em suas nádegas. Virou-se a procura do atrevido e não viu
nada. Seguiu o caminho, disposta a dar um soco no safadinho. Apesar
da atenção redobrada, o safado tocou-lhe os seios! Vermelha de
raiva e de vergonha, com a mão espalmada pronta para um bofetão....
e nada! O espertinho era rápido demais.
O assédio a acompanhou
até sua casa, irritando-a muito. Ao entrar, tentou se certificar de
que ninguém a espreitava, e entrou de pressa. Mas sentiu que alguém
invisível passar por ela, tomando a dianteira.
Durante o jantar, ficou
calada. Seus pais estranharam e perguntaram sobre a causa. Após
algumas evasivas, eles a deixaram em paz.
No quarto, teve sonhos
eróticos. Já os tivera antes, mas não daquela forma. Muito
realistas e um sexo intenso e constante. Isso a assustou mais do que
excitou. Levantou-se sobressaltada e acendeu a luz da cabeceira. A
luz iluminou-a e mostrou sua sombra na parede. Ela custou a conter um
grito que se formava em sua garganta. Sua sombra estava em louca
orgia com a sombra de um rapaz!
Procurou aterrorizada
em seu quarto quem projetava aquela sombra e não viu ninguém.
Tentou se acalmar e com a cabeça um pouco mais fria, lembrou-se do
início da aventura de Peter Pan. A sombra fujona!
Correu então abrir a
janela. Peter Pan que viesse e levasse embora aquela sombra safada!
Não precisou esperar
muito. Pela janela entrou voando um rapaz de cerca de 16 anos (Peter
crescera!). Foi direto à sombra, tentado arrancá-la força de suas
atividades mais interessantes.
Alice trancou a janela.
E gritou:
— Peter! Seu safado!
Ele olhou assustado.
Gaguejou tentando se desculpar e ficou rubro como uma maçã. Alice
riu e disse:
— Sua sombra é mais
esperta que você!
Ele a olhou encabulado
e respondeu:
— Desculpe por ela!
Ela tem me dado muito trabalho. Wendy a costurou para mim, mas a
linha esgarçou com o tempo. E toda vez que ela foge de mim, vem pra
o mundo real. E indo atrás dela eu cresço um pouquinho... Se ela
fugir mais uma vez, não conseguirei voltar à Terra do Nunca. Você
me ajuda?
Alice pegou a sua cesta
de costuras. Tirou de lá de dentro uma tesoura e cortou a ligação
com sua própria sombra!
Peter olhou-a incrédulo
e reclamou:
— Sem minha sombra
não posso voltar a Terra do Nunca!
Alice sorriu e o
beijou. Ela percebeu sua relutância.
— Deixe sua sombra
livre e torne-se também livre! Peter, crescer é uma aventura
maravilhosa!
E novamente o beijou.
Sua janela tem ficado
sempre aberta. Seus amigos passaram a estranhar por que ela não faz
sombra. E a polícia tem relatado ações de um ladrão muito esperto
e fugaz, tão fugaz que as vítimas relatam que ele sai voando da
cena do crime...
Alvaro 2009
ilustrações: Alice , xilogravura da primeira edição
Capa do livro Peter Pan & Wendy de 1915
ilustrações: Alice , xilogravura da primeira edição
Capa do livro Peter Pan & Wendy de 1915
Um comentário:
Minha sombra é livre, assim como eu sou. Legal essa história, parabéns!
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