sexta-feira, março 08, 2019

8 de Março. Dia de Luta. Dia de Luto.



Notícias alarmantes nos jornais.

Mulheres agredidas
Espancadas
Cruelmente mortas.


E não é do outro lado do mundo.
É sua vizinha
Sua irmã
Sua mãe.

Talvez ela mesma.

Mas esperam
Que tudo isso seja apagado
Com uma rosa vermelha...



Alvaro Domingues 2019


quarta-feira, fevereiro 06, 2019

O Trem dos Iluminados

à maneira Zen



Há uma história que contam há muito tempo, onde um sujeito, se julgando muito sábio, soube que na estação de sua cidade passaria o trem para levar os iluminados. Seus mestres lhe haviam dito que passariam muitos trens, mas só um seria brilhante e estaria escrito "Só para os iluminados".

Ele vestiu sua roupa vermelho e laranja foi até a estação e ficou esperando, achando que o trem logo viria. Uma hora, duas horas, e nada. Um dia inteiro e nada. No segundo dia ficou aborrecido. No terceiro dia xingou seus mestres, mas persistiu, imaginando ser um teste. No quarto dia, resolveu desistir, mas ao abandonar o seu posto indo em direção à saída, começou a observar as pessoas. Alguns estavam vestidos como ele e esperavam pelo mesmo trem. Outros eram pessoas comuns que esperavam outros trens, para seguirem suas vidas. Percebeu que alguns precisavam de ajuda. Uns estava perdidos, outros com fome, outros estava tristes porque um ente querido estava viajando para uma viagem muito longa. Resolveu ajudar no que podia. Aos poucos foi aprendendo a lidar com as necessidades de cada um e a espera pelo trem não se tornou um fardo e ele começou a aceitar que ele nunca viria. Até que um dia o trem apareceu e parou na estação. Percebeu que só ele via o trem. Mesmo as pessoas que estava esperando por ele não perceberam a sua presença. O controler do trem perguntou:

-- O senhor não vai embarcar?

O homem, desconfiado, perguntou:

-- Por que só eu vejo o trem?

O controler respondeu:

-- Porque só você teve compaixão.

O homem pôs o pé na escadinha e quando ia embarcar, olhou para trás e disse:

-- Não posso ir. Essas pessoas precisam de mim.

O controler sorriu e disse:

-- Tem mais algumas pessoas para quem o senhor deve dar ajuda, mesmo que eles não queiram.

-- O homem, intrigado perguntou:

-- Quem?

A resposta foi:

-- Os que, como você, se acham iluminados.



Alvaro Domingues - 06/02/2019

domingo, setembro 24, 2017

Refugiados



Deixamos de lado
Nossas casas
Nossas coisas
Nossos amigos
Nossos parentes
Aqui estão apenas
As nossas vidas.

Diante inexpugnável muro
Não de tijolos,
Não de pedra,
Não de aço,
Mas de ódio!

Suplicamos em vão.
Firmes rostos de pedra
Nos olham com desprezo.

Mas surge uma brecha:
Alguns corações ainda vacilantes
Sem ter endurecido totalmente
Nos dizem:
– Passem, enquanto olhamos pro outro lado.


© Alvaro Domingues 2017

quinta-feira, junho 16, 2016

Pássaro de Fogo



Foi num sonho que vi

Medonha fera
Terrível Quimera
Que tudo engolia
O povo gritava
A todo momento,
Em grande Agonia

Sangue, dor e sofrimento
Não há Esperança
Contra tamanha vingança

Mas eis que surge no Horizonte
Pássaro reluzente
De brilhos dourados
E tons avermelhados.

Foi num sonho que vi

Em passada era
A Terrível Quimera
Em luta sangrenta
De morte ferira
O grande Pássaro de Fogo.

Mas Fênix ressurge das Cinzas
Novamente, a fera enfrenta
Em batalha cruenta
Dentes e Garras
Se atracam.
O Vermelho Sangue
Inunda o campo.

A cruel fera agora jaz
Ferida de morte.

E em vôo elegante
O pássaro triunfante
Os céus alcança
Anunciando nova Aliança.

Destruída a Quimera
Inciará nova era.

Foi num sonho que vi

Alvaro Dezembro de 2005

sábado, maio 28, 2016

Proteção


Diante da tempestade
Do alto do edifício
O guarda chuva aberto
Protege a Nação

Alvaro 28 de maio de 2016

sábado, abril 30, 2016

Lobo da Estepe



A rua de paralepipedos molhados pela chuva reflete a luz do luminoso. 
As letras ao contrário revelam que haverá um espetáculo. 
Será no Teatro Mágico. O convite é só para os raros e só para os loucos...
Mas... quem será louco suficente para enxergar dentro de si mesmo?
E um Lobo segue solitário pelo meio da rua...


Alvaro 14/11/2004
Poema inspirado no livro Lobo da Estepe, de Herman Hesse 
e na Música Sound of Silence de Simon e Garfunkel 
imagem: rua de Lisboa, capturada na Web,sem indicação de autoria e alterada no Paint.net



quinta-feira, fevereiro 04, 2016

Politicamente Correto



O judeu esperava o policial que iria prendê-lo. É lógico que nem judeu nem policial seriam as palavras empregadas. Nem o verbo "prender". Mas para captar o que estaria acontecendo foi necessário que eu usasse a língua antiga, anterior a Reforma. Não se preocupe se não entender algumas palavras. A Universidade está preparando um dicionário que em breve estará sendo vendido a preços populares. Espero que sejam sinais de um novo tempo.

Aliás a exigência do Judeu para ser preso foi que o policial que viesse fosse culto o suficiente para usar a língua antiga. A Agência de Preservação das Minorias teve um trabalho muito grande para achar alguém, mas, por sorte, um dos agentes especiais tinha curso de história.

A campainha tocou. Do outro lado da porta o Judeu viu um homem de cerca de trinta anos, com um uniforme cinza. Cor irritantemente neutra. Convidou-o entrar e sentar-se na sala. O Agente assentiu com a cabeça e sentou-se numa das poltronas do aposento e o Judeu escolheu a outra, em frente. Ele esperou ao agente examinar o ambiente a sua volta antes de começar a conversar.

Os olhos do agente percorreram uma a uma das peças ali. Quadros, armas antiga, uniformes de soldados  e oficiais, objetos de uma época que a Humanidade queria esquecer. O silêncio durou cerca de  dois minutos, quebrado pela pergunta do agente, em bom vernáculo da língua antiga:

-- Por que objetos Nazistas? Que prazer mórbido teria você um Judeu em colecionar objetos símbolos de sua opressão?




O Judeu sorriu e respondeu:

-- São apenas objetos. E eu os colecionei apenas para provar isso. Não para mim nem para os meu pares, mas para todos. Sou um historiador como você. Apaixonado pelo passado e de reconstruí-lo para que as gerações futuras entendessem que tinham uma origem e teriam um futuro. 

--Mas onde encaixa esta coleção? Você sabe que apenas mencionar qualquer referência aos nazista é proibida. O que se dirá de uma coleção desta?

-- Eu sei. E sei também que botar o dedo em qualquer ferida aberta contra uma minoria é crime. E muitas vezes no meu trabalho esbarrei em várias delas, algumas abertas pelo meu próprio povo. No início me deram liberdade para pesquisar desde que meus trabalhos não saíssem do ambiente da Universidade. Mas depois, primeiro era difícil achar fontes de pesquisa adequadas. Volumes significativos sumiam. Sumiam também qualquer menção a eles. Os bibliotecários olham espantados, dizendo, "nunca tivemos este exemplar". De Mein Kampf até O Senhor do Anéis. Depois, meus próprios trabalhos sumiram. Por fim, meu registro foi cassado. 

-- Senhor, não há mais lugar para historiadores. Somos felizes sem diferenças de espécie alguma. E historiadores nos trazem lembranças de um tempo que não volta mais.

-- Percebi isto. Você parece estar conformado com sua situação. Um historiador que virou policial. Mas voltando a minhas razões, escolhi o Nazismo justamente pela contradição. Um judeu colecionando objetos nazistas... Ironia pura. Para caracterizar o ridículo da minha prisão (que vocês insistem em chamar de reeducação). 

-- Meu senhor, seriam pra seu próprio bem e para o bem da sociedade. Não queremos mais nenhuma discriminação. Nenhum preconceito.

-- E você acha que eu quero? Não creio que seja eficaz simplesmente negar a existência de diferenças e de uma tal maneira que chegaram a queimar livros em praça pública! Isso me levou aos nazistas também. O que era diferente estava fora. Nos tornamos iguais. Mas não entre nós. Iguais aos nazistas!




O rosto de pedra do policial deu mostras de perturbação. As palavras do Judeu acordaram o historiador adormecido. Não foram suficientes para ele relaxar o cumprimento de seu dever. O Judeu foi levado para um instituição de reeducação. Era como chamavam o presídio. 

Alguns dias depois o policial pediu exoneração. Foi o inicio deste movimento.

Eu era aquele policial.


Alvaro A. L. Domingues
Publicado originalmente no livro Sombras e Sonhos, da Balão Editorial

Nota: Não defendo ideologias totalitárias nem qualquer tipo de discriminação. Apenas acredito que não devemos varrer a história para baixo do tapete.